Tratamentos

Endometriose

Você já deve ter ouvido falar na seguinte frase: “a endometriose é a doença da mulher moderna”. Seria essa uma heresia assim como aquelas que querem atingir o posicionamento e ascensão da mulher na sociedade atual ou teria algum sentido fisiológico por trás dessa percepção?

Em 100.000 anos de existência do homo sapiens, 10.000 anos de história da civilização nunca a mulher foi exposta a tantos episódios menstruais como nos últimos 50 anos a partir do advento da pílula anticoncepcional.

A capacidade do homo sapiens do sexo feminino de estar fértil mensalmente na sua evolução, fez com que ela fosse privada da exposição ao sangue menstrual. Uma vez fértil ela engravidava, desta forma 9 meses da sua existência, a menstruação estaria ausente. Logo o rebento nasceria e necessitaria do leite materno e isso anularia por mais alguns meses esta característica fisiológica do sangramento, e assim que a hemorragia brotasse novamente e com ela a fertilidade, o ciclo voltaria a se repetir.

A mulher moderna menstrua inúmeras vezes mais que todas as mulheres da história e da existência do homo sapiens.

No processo menstrual, após a queda dos níveis hormonais dos ciclos isentos de fecundidade, o endométrio (epitélio que reveste a cavidade uterina) descama; e nele mistura-se algum sangue. Ajudado pelas contrações uterinas que se tornam mais frequentes nesse período, a mistura é expelida para o exterior através da cavidade genital. Porém na cavidade uterina, esse não é o único caminho, há ainda outros dois pertuito, os caminhos das tubas uterinas. Esses outros trajetos promovem um gotejamento do sangue, misturado ao endométrio, para o interior da cavidade abdominal.

O sangue, uma mistura de células, ferro e oxigênio causa um desbalanço dessa cavidade chamado “stress oxidativo”, aquele vilão que é muito utilizado atualmente como justificativa para a venda de vitaminas. Sim, elas são antioxidantes, mas com ação limitada e não conseguem combater sozinhas, mesmo em altas doses, um processo como esse.

Mas não se esqueçam daquele outro componente, as células endometriais! Essas sorrateiramente aproveitam desse desbalanço bioquímico e imunológico e rompem o tecido que reveste internamente a cavidade abdominal chamado peritoneo. Após a rotura, implantam-se, reproduzem-se, promovendo condições adequadas para sua própria nutrição e sobrevivência através de novos vasos sanguíneos até definitivamente se instalarem nesse novo ambiente.

Esse novo “ser” implantado dentro da barriga feminina pode continuar a crescer e infiltrar mais profundamente os tecidos, causar obstruções, aderências entre as estruturas, endurecer a superfície dos ovários ou simplesmente inflamar promovendo dor, aquela que mensalmente “grita” ao lembrar o advento do seu surgimento, a menstruação.

Bom, essa é a história da endometriose, ela surge da elevada exposição do abdome da mulher moderna ao sangue menstrual, podendo causar:

  • dor pélvica e/ou
  • cólicas menstruais e/ou
  • dor durante as relações menstruais e/ou 
  • alterações urinarias e intestinais durante a menstruação

No entanto, se a mulher não tem nenhum destes sintomas, mas apresenta infertilidade, a endometriose deve ser investigada.

Apesar de estar presente em aproximadamente 25% das mulheres com dificuldade de engravidar, a endometriose é subdiagnosticada. Para se fazer o diagnóstico, inicialmente precisa-se conhecer bem a doença, realizar um bom exame ginecológico (muitas vezes pelo toque vaginal já é possível desconfiar da endometriose) e, principalmente, pedir o exame correto realizado por um profissional qualificado que é o ultrassom transvaginal com preparo intestinal.

O tratamento da endometriose pode ser clínico ou cirúrgico a depender da extensão e localização das lesões, bem como da finalidade do tratamento. Nas mulheres com endometriose e infertilidade o tratamento de escolha é o cirúrgico ou a utilização de técnicas de reprodução assistida.

A cirurgia habitualmente é realizada por laparoscopia e normalmente multidisciplinar, já que a doença pode não só acometer os órgãos ginecológicos, como útero e ovário, mas órgãos adjacentes, como bexiga, ureter e intestino.